Ir para o conteúdo

/9

Mapa da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, ferrovia situada no atual estado de Rondônia, que teve suas obras executadas entre 1907 e 1912. Estendia-se por 366 quilômetros, ligando Porto Velho a Guajará-Mirim. 1904. Coleção de Jorge A. Ferreira Jr. Revista Kosmos

 

Com o encerramento do ciclo das grandes campanhas sanitárias no Rio de Janeiro, o Instituto Oswaldo Cruz passou a ser requisitado para combater surtos epidêmicos e casos de doenças endêmicas em várias regiões do país. Em atendimento a contratos estabelecidos com órgãos públicos e privados, Oswaldo Cruz organizou expedições científicas e de profilaxia que ajudaram a disseminar o modelo campanhista.

Em um primeiro momento, a malária foi o grande problema a ser enfrentado, e duas missões, ambas lideradas por Carlos Chagas, se destacaram. A primeira foi em Itatinga, no interior de São Paulo, onde a Companhia Docas de Santos construía uma hidrelétrica. Realizada em 1905, foi a primeira campanha bem-sucedida contra o impaludismo no país, servindo de modelo para as que viriam depois. A segunda ocorreu no norte de Minas Gerais, para onde Carlos Chagas seguiu, em meados de 1907, acompanhado de Belisário Pena. Foi nessa região, na pequena cidade de Lassance, que Chagas descobriria, dois anos depois, a tripanossomíase americana, doença que hoje leva o seu nome.

Apesar do sucesso dessas expedições, as viagens mais importantes do Instituto foram realizadas entre 1910 e 1913. Se as primeiras campanhas tiveram um objetivo específico e ficavam restritas a pequenas áreas, as novas missões percorreram vastos territórios, do Nordeste à Amazônia, e também no Centro-Oeste. Além do combate às epidemias, elas tiveram acima de tudo motivação científica e forneceram um verdadeiro inventário das condições de vida e saúde do interior do país.

Oswaldo Cruz comandou, ele próprio, duas dessas expedições, ambas em 1910. Com Belisário Pena, esteve primeiro em Porto Velho (RO), onde era construída a estrada de Ferro Madeira–Mamoré. O empreendimento ficara conhecido como “A Ferrovia do Diabo”, tal o número de vítimas que a malária, principalmente, fazia entre os operários. Impossibilitado de sanear a região, Oswaldo estabeleceu medidas duras: a indicação de doses maciças de quinino e, ao fim do dia, o recolhimento obrigatório dos trabalhadores a seus alojamentos sob a proteção de mosquiteiros.

A segunda missão teve início em novembro daquele ano, quando, a pedido do governo do Pará, iniciou em Belém o combate a uma epidemia de febre amarela que se espalhava pela cidade. Oswaldo utilizou as mesmas ações profiláticas que adotara no saneamento do Rio de Janeiro: perseguição aos mosquitos, isolamento dos doentes, expurgos e desinfecções. Em apenas seis meses a doença estava erradicada.

Sem a presença de Oswaldo Cruz, outras expedições percorreram o interior do país entre 1911 e 1913: Astrogildo Machado e Antônio Martins estiveram nos vales dos rios São Francisco e Tocantins; Artur Neiva e Belisário Pena passaram por Goiás, Pernambuco, Bahia e Piauí; José Gomes de Faria e João Pedro de Albuquerque visitaram Piauí e Ceará; Adolfo Lutz e Astrogildo Machado desceram o rio São Francisco, no trecho entre Pirapora (MG) e Juazeiro (BA); Carlos Chagas, Antônio Pacheco Leão e João Pedroso percorreram vasta região na bacia amazônica.Todas essas viagens mostraram um Brasil desconhecido da maioria dos brasileiros. A revelação do drama vivido por suas populações, suas trágicas condições de vida, causou grande impacto entre alguns segmentos da elite política e intelectual do país, fornecendo a base para a criação de um movimento pelo saneamento dos sertões, o qual daria origem, em 1918, à Liga Pró-Saneamento do Brasil. Liderada por Belisário Pena, a Liga tinha como principal objetivo a instituição de uma política sanitária em bases nacionais e centralizada pelo governo federal. Algumas de suas ideias seriam postas em prática alguns anos depois da morte de Oswaldo Cruz.